terça-feira, 18 de novembro de 2014

Do garimpo à logística reversa:
Sem logística reversa, hoje, um país não faz projetos a longo prazo. Para chegar lá, organização empresarial é estratégica.

Até 1994, o Brasil não produzia celular; hoje, são mais de 190 milhões. Também não produzia computador; entram hoje no mercado 14 milhões de novas unidades ao ano. Todos eles duram pouco nas mãos do usuário, já que o homem virou um grande consumista, que venera novas compras. O pior é que, após o consumo, só 1% dos celulares e menos de 5% dos computadores retornam aos fabricantes brasileiros. Sem valor agregado, acabam no lixo comum ou em locais impróprios.
No Brasil, estima-se que apenas 6% do que se fabrica retorna à cadeia produtiva por ter valor agregado - caso das baterias de automóveis e do alumínio, por exemplo. Ainda que baixo esse percentual de logística reversa dos produtos nacionais movimenta até 10 bilhões de reais por ano, grande parte devido a produtos que ainda não foram consumidos e uma pequena parcela de produtos usados.
 A Política Nacional de Resíduos Sólidos chega agora ao país atribuindo a todo o elo da cadeia produtiva a responsabilidade compartilhada pela destinação dos produtos usados, agora denominados resíduos sólidos, diferenciando-os dos rejeitos. A obrigatoriedade da medida dá a largada para que se explore o potencial de retorno intrínseco a alguns produtos e suas embalagens, como também para que empresas se organizem setorialmente para arcar com os custos do sistema.
Apenas 6% do que se fabrica retorna à cadeia produtiva brasileira por ter valor agregado. Ainda que baixo percentual movimenta até 10 bilhões de reais por ano
Afinal, logística reversa é cara. Quando o valor agregado não é bom, a conta não vai equilibrar nunca. Embora varie muito de um produto a outro, a recuperação de valor dos componentes e materiais constituintes desses produtos não representa, via de regra, mais do que 30% do custo total da logística reversa de pós-consumo. Quanto mais empresas no pool, menor será o ônus individual.
Nesse processo, o Brasil tem muito a aprender. A lição principal é a de adaptar modelos já testados que integrem os elos da cadeia. Na nossa realidade, além dos setores produtivos, isso inclui o catador, que hoje vive na informalidade, em condições inóspitas, sem garantias sociais. Com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o catador será incluído no sistema formal. Para estar ali, precisará reeducar o olhar e reaprender a trabalhar. A triagem que ele faz hoje deixa a desejar do ponto de vista da logística reversa. Ele garimpa ferro, papelão e metais. O resto, sem valor de venda, ele deixa para trás. São milhares de pessoas disputando os mesmos produtos e preterindo toneladas de objetos que precisam ser recuperados.
Para reaproveitar todo esse novo volume, o mercado deverá superar certos preconceitos sociais e industriais quanto ao consumo. Matéria-prima reciclada ou mesmo motor manufaturado não têm necessariamente baixa qualidade, como o senso comum insiste em dizer. Poderão ter certificações, comprovação de qualidade, excelência de performance. Outro preconceito a combater é aquele que diz que o cidadão não contribui na devolução dos produtos. É necessário oferecer condições logísticas adequadas a ele e incluir o comércio local na solução.
Setores produtivos precisam conversar mais, do fabricante ao varejo, trabalhar junto para achar caminhos e, claro, estimular o consumidor. Sem envolvimento e organização empresarial, não há logística reversa que funcione. E sem logística reversa, hoje, um país não faz projetos a longo prazo.

Fonte: Paulo Roberto Leite. Presidente do Conselho de Logística Reversa do Brasil (CLRB)

Enviado Pelo Consultor: Daniel Ponciano

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